01
fev

Governo planeja criar ‘superlaboratório’ com apoio do BNDES

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, disse que vai fomentar pesquisas no país. O governo quer criar um “superlaboratório” nacional para competir de igual para igual com as grandes multinacionais que atuam no país. O BNDES vai financiar esses projetos. Em entrevista ao Jornal Valor Econômico, o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, afirmou que o BNDES buscará fortalecer as indústrias nacionais para que elas tenham escala como as grandes companhias farmacêuticas internacionais. “O governo vê como positiva a criação de uma grande empresa nacional”, afirmou o ministro.

Desde o fim do ano passado, o BNDES tem conversado reservadamente com empresas nacionais. O banco propõe financiar fusão entre laboratórios e também aquisições, por meio do Profarma, programa de fomento voltado para o setor farmacêutico, cujo orçamento é de R$ 3 bilhões até 2012. Até dezembro, os financiamentos do BNDES já somavam R$ 1,374 bilhão. Os planos do governo de fortalecer as empresas nacionais começaram a ser discutidos em 2008, mas ganharam força no fim do ano passado, impulsionados pelo intenso movimento de concentração do setor. “O governo quer evitar que multinacionais adquiram empresas nacionais de peso, a exemplo do que ocorreu com a Medley, que foi comprada pela companhia francesa Sanofi-Aventis”, afirmou uma fonte do setor.

Temporão disse que o governo também quer estimular investimentos em pesquisas e desenvolvimento (P&D) de empresas nacionais e troca de tecnologia. O BNDES financiou cerca de R$ 302 milhões em P&D até dezembro e pretende elevar esses investimentos nos próximos meses. Procuradas pelo Valor, empresas nacionais classificaram como positiva a iniciativa do governo, por meio do BNDES, de financiar o fortalecimento do setor, desde que não seja por compra de participação. O banco estaria estudando ter participação acionária, por meio do BNDESPar, na Hypermarcas, empresa que no ano passado comprou a Neo Química, de Goiás, desbancando a americana Pfizer, que também estava no páreo.

A companhia nacional estuda novas aquisições de laboratórios farmacêuticos no país e deverá ter financiamento do BNDES. Sobre ter participação acionária em companhias farmacêuticas, o BNDES não comenta o assunto. Grandes grupos nacionais, como EMS, Aché, Eurofarma, Cristália, confirmaram que já foram sondados por companhias multinacionais, mas afirmam não ter interesse, neste momento, em negociar seu controle ou mesmo participação. Grandes laboratórios internacionais também foram ouvidos e afirmaram ter interesse em investir no Brasil e que já estudam oportunidades neste sentido.

O governo tem acompanhado atento ao movimento de concentração no Brasil e acredita que companhias nacionais fortalecidas, com pesquisas em inovação, podem trazer uma nova visão estratégia da saúde no país. Segundo o ministro, o papel da saúde, além de ter um forte componente de política social, tem de ter uma visão industrial, mas com foco em desenvolvimento. Temporão tem uma preocupação em reduzir o déficit comercial do governo, que ficou em torno de US$ 7 bilhões no ano passado. O governo pretende baixar esse valor para até US$ 4,4 bilhões e desenvolver tecnologias para a produção, no país de 20, de produtos estratégicos do SUS (Sistema Único de Saúde) até 2013. “Participamos de viagens com empresários com o objetivo de atrair investimentos em pesquisas no país, estimulando troca de tecnologia”, afirmou o ministro.

Temporão citou o acordo fechado no ano passado entre a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), vinculada ao Ministério de Saúde, com a inglesa GlaxoSmithKline (GSK), para que a companhia forneça sua vacina pneumocócica para ser incluída no calendário do programa nacional de imunização a partir deste ano. Além da transferência de tecnologia, o acordo prevê a instalação de um centro de pesquisa e desenvolvimento de tratamentos contra doenças como dengue, malária e febre amarela no país, avaliado em EUR 70 milhões, no qual a farmacêutica se compromete a investir metade deste valor. Também no ano passado, em viagem à China, o laboratório farmacêutico EMS, o maior do país, fechou acordo de transferência de tecnologia com a chinesa Shanghai Biomabs para a fabricação no Brasil de seis produtos biotecnológicos de última geração, afirmou Temporão, que também participou da viagem. Dentre esses produtos estão os chamados anticorpos monoclonais, medicamentos biológicos com indicação para tratamento de doenças graves e de alto custo, especialmente câncer, artrite reumatoide e osteoporose.

Segundo o ministério, o primeiro produto alvo dessa parceria com a China será o Etanercepte, cuja indicação principal é a artrite reumatoide, e que hoje gera gastos anuais da ordem de R$ 80 milhões ao governo, principal comprador desse medicamento. Temporão defende o programa do governo, o chamado Complexo Industrial da Saúde, como forma de estimular programas mobilizadores em áreas estratégicas para levar o Brasil a ter domínio sobre o conhecimento científico-tecnológico. Segundo o ministro, o governo concluiu nove projetos envolvendo parcerias, nos quais participam sete laboratórios públicos, sete privados, um deles estrangeiro, para o desenvolvimento de 14 produtos. Esses projetos somam compras anuais da ordem de R$ 650 milhões, com economia estimada entre R$ 130 milhões/ano e R$ 150 milhões/ano, nos próximos cinco anos. Em 2009, o Brasil movimentou R$ 30,2 bilhões em vendas de medicamentos. O potencial é de crescimento acima de dois dígitos nos próximos anos. “Há dez anos o perfil dos laboratórios nacionais era de poucos investimentos e escala baixa. Hoje a situação é bem diferente. Já temos multinacionais brasileiras”, afirmou uma fonte.

Do Jornal Valor Econômico

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